quinta-feira, 10 de maio de 2012



April was the cruellest month #5







Não gosto de misticismos. Ironicamente, o meu imaginário é povoado por redes complexas de associações líricas e mitológicas. Acredito em divindades improváveis, como os livros, as pedras, ou os girassóis. Gosto de pequenos rituais, em altares simulados, que espalho pela casa. Um frasco de vidro translúcido com flores, três pedras lisas no canto de um móvel, quatro conchas dispostas em arco, em redor de um objecto mundano. São os meus amuletos, os meus totens, a minha garantia de que é possível atravessar os dias em segurança, à margem do apelo dos velhos demónios. Porque gosto do sol, do mar, dos passeios nos lugares desabitados, do recolhimento dentro das histórias, cada um destes objectos me recorda de que o mundo não está em ruínas; que existe ainda o sol, o mar, os lugares pouco habitados e o conforto das histórias. Por causa de cada um destes objectos - o percurso matinal, desde o quarto à outra ponta da casa, "bom dia, concha", "bom dia, pedra", "bom dia, flor" - é possível respirar claramente, acreditar que em breve será possível correr para o exterior e sacudir o mofo do inverno agarrado aos ossos. A minha única religião é a do girassol e, por isso mesmo, não medito dentro de casa.


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sábado, 13 de agosto de 2011



foi tudo tão rápido que nem tive tempo de me despedir






Fui expulsar o inverno dos ossos para sul. Não apanhei um escaldão. Fui engolida por uma onda, que felizmente me cuspiu de volta. Fiz crescer a minha colecção de azuis-perfeitos, e (re)visitei alguns dos meus lugares mágicos. Comi ostras e todas as obscenidades a que tenho direito. Mafarriquei quanto baste e, pelo caminho, ainda papei a trilogia Millenium, de Stieg Larsson. Agora estou de regresso, mas ainda tenho duas semanas antes de voltar ao velho ofício de funcionária cansada. Prometo que volto já a deprimir, mas por enquanto sou uma mulher feliz.





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quarta-feira, 8 de junho de 2011





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sábado, 29 de janeiro de 2011



Sísifo (finalmente feliz)


quando consegui
imaginar Sísifo feliz
fui desfazendo o meu rochedo
com afincada dedicação
o desgastei e desbastei
(porque toda a pedra se quer mínima e polida)

fui desfazendo o meu rochedo
para que mais nada me doesse
e pudesse transportá-lo no bolso
e enfim:

terminei com um mero
grão de areia.






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domingo, 24 de outubro de 2010



Da passagem das estações e do conhecimento do inferno


Qualquer coisa acontece em Setembro que me faz sempre duvidar se Abril é ou não é, afinal, o mais cruel dos meses. O fim do verão devolve-me à alternância entre o exílio e o reino. Qualquer coisa dentro do meu corpo emudece. Acorda todo o séquito dos demónios. A idade ensina a domesticá-los, mas alguns são já velhos rezingões, não é fácil persuadi-los a voltar ao sono. Enquanto resistem, vão tocando aqui e ali onde dói.

Não há tempo para os livros, não há tempo para as palavras, não há tempo para (quase) nada. A vida continua suspensa, adiada mais um pouco, à espera do tempo para ser vivida. Sou um mero projecto daquilo que quero ser. Sou um bicho que vai deixar de escalar estantes, porque o corpo já não aguenta a vertigem. Sou um bicho que volta a ser apenas bicho-do-mato. Os desejos em hibernação, as expectativas em pausa. Uma vida para breve, é o que se espera.





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quarta-feira, 11 de agosto de 2010




Aqui despi meu vestido de exílio
E sacudi de meus passos a poeira do desencontro


Sophia de Mello Breyner Andresen



















































És tu a Primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante.


Sophia de Mello Breyner Andresen






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segunda-feira, 26 de julho de 2010



antecipação:




Edward Hopper | Room by the sea




Como se poderá perceber pela escalada do tom deste blog nos últimos dias, aquilo de que mais gosto no ano inteiro é, no verão, o curto período que antecede imediatamente a partida para férias. A preparação. O ritual. A antecipação dos lugares, o devaneio deliciado, a escolha cuidadosa das leituras e da banda sonora. Levo comigo o aforismo de René Char e agora também eu sei que quem ama o girassol não meditará dentro de casa (in your fucking face, agoraphobia!). Vou em direcção aos campos de girassóis, em direcção ao mar, verão adentro. É bom o exílio, é boa a dor martirizada sobre o corpo, para que seja transbordante a alegria da conquista de um reino. Vou para encontrar-me entre iguais. E vou bem acompanhada. Tenho o meu lugar onde pousar a cabeça, e tenho algumas horas de boa música para a viagem. E meti na mala estes companheiros:


O jardim dos Finzi-Contini, Giorgio Bassani
Verão, Edith Wharton
Raparigas da província, Edna O'Brien
Estranho é viver, Carmen Martín Gaíte
The suspicions of Mr. Whicher, Kate Summerscale






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posted by saturnine | 23:15 | 0 Comentários


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a little bit more on less is more


É verdade que não é só o lugar que condiciona a construção da identidade. Houve um momento chave, em que me veio parar às mãos a obra completa da Sophia de Mello Breyner Andresen.





As grutas

O esplendor poisava solene sobre o mar. E – entre duas pedras erguidas numa relação tão justa que é talvez ali o lugar da Balança onde o equilíbrio do homem com as coisas é medido – quase me cega a perfeição como um sol olhado de frente. Mas logo as águas verdes em sua transparência me diluem e eu mergulho tocando o silêncio azul e rápido dos peixes. Porém a beleza não é solene mas também inumerável. De forma em forma vejo o mundo nascer e ser criado. Um grande rascasso vermelho passa em frente de mim que nunca antes o imaginara. Limpa, a luz recorta promontórios e rochedos. É tudo igual a um sonho extremamente lúcido e acordado. Sem dúvida um mundo novo nos pede novas palavras, porém é tão grande o silêncio e tão clara a transparência que eu muda encosto a minha cara na superfície das águas lisas como um chão.
As imagens atravessam os meus olhos e caminham para além de mim. Talvez eu vá ficando igual à almadilha da qual os pescadores dizem ser apenas água.
Estarão as coisas deslumbradas de ser elas? Quem me trouxe finalmente a este lugar? Ressoa a vaga no interior da gruta rouca e a maré retirando deixou redondo e doirado o quarto de areia e pedra. No centro da manhã, no círculo do ar e do mar, no alto do penedo, no alto da coluna está poisada a rola branca do mar. Desertas surgem as pequenas praias.
Eis o mar e a luz vistos por dentro. Terror de penetração na habitação secreta da beleza, terror de ver o que nem em sonhos eu ousara ver, terror de olhar de frente as imagens mais interiores a mim do que o meu próprio pensamento. Deslizam os meus ombros cercados de água e plantas roxas. Atravesso gargantas de pedra e a arquitectura do labirinto parece roída sobre o verde. Colunas de sombra e luz suportam céu e terra. As anémonas rodeiam a grande sala de água onde os meus dedos tocam a areia rosada do fundo. E abro bem os olhos no silêncio líquido e verde onde rápidos, rápidos fogem de mim os peixes. Arcos e rosáceas suportam e desenham a claridade dos espaços matutinos. Os palácios do rei do mar escorrem água e luz. Esta manhã é igual ao princípio do mundo e aqui eu venho ver o que jamais se viu.
O meu olhar tornou-se liso como um vidro. Sirvo para que as coisas se vejam.
E eis que entro na gruta mais interior e mais cavada. Sombrias e azuis são as águas e paredes. Eu quereria poisar como uma rosa sobre o mar o meu amor neste silêncio. Quereria que o contivesse para sempre o círculo de espanto e de medusas. Aqui um líquido sol fosforescente e verde irrompe dos abismo e surge em suas portas.
Mas já no mar exterior a luz rodeia a Balança. A linha das águas é lisa e limpa como um vidro. O azul recorta os promontórios aureolados de glória matinal. Tudo está vestido de solenidade e de nudez. Ali eu quereria chorar de gratidão com a cara encostada contra as pedras.






Esse momento redefiniu-me e é daí que vem a minha noção aguçadíssima do lirismo implícito da vida quotidiana. É daí que vem a minha convicção de que a poesia é como uma pedra polida e, por conseguinte, minimalista. Aprendi que cada palavra deve ser exacta, nem mais, nem menos. Aprendi que é bom ter o conhecimento do inferno, e a descrever com exactidão as imagens desse inferno. Aprendi que este conhecimento que dói pressupõe também a alegria do recomeço. Por isso preciso do mar, que se converte no elemento essencial onde é possível fazer a limpeza da alma, renascer, recomeçar. Aprendi também que pertenço à raça daqueles que mergulham de olhos abertos/ E reconhecem o abismo pedra a pedra anémona a anémona flor a flor* e que o mar de Creta por dentro é todo azul. Todo azul. Não é verde, nem azulado. Azul.




* O Minotauro



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domingo, 13 de junho de 2010



planos para dominar o mundo #11






Sobrevivemos. O mundo está um desastre, mas nós queremos dominá-lo na mesma. Declaro oficialmente aberta a época do sol, e vivas para mim que já não precisarei mais meditar dentro de casa. Agora é favor parar lá com esse frio chuvoso mete-nojo para eu começar a dominar como deve ser, 'tá? Venham os perfumes das trepadeiras nos passeios nocturnos, os cocktails na esplanada ao fim da tarde, os livros da Ana Teresa Pereira em atraso. Mundo, sai da frente, que eu vou recuperar a vida que levaste emprestada. Diz que é uma espécie de feeling good, mas sem a Nina Simone, e com a antecipação de banda sonora para as viagens de carro até à praia:







The Drums | Let's go surfing






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enxotar o pó


Estamos em spring cleaning tardia. Enxotar o pó, enxotar o mofo, enxotar a melacolia dos ossos e a humidade da cabeça. Enxotar o que resta do inverno. Mundo, estou de volta! E pronta para partir tudo.





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posted by saturnine | 12:48 | 1 Comentários


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terça-feira, 23 de março de 2010



being idle #2


Há na Língua Portuguesa uma falha que é urgente resolver: a falta, no nosso dicionário, do verbo esplanar. Esplanar seria o verbo que viria oficializar o acto de ficar numa esplanada durante tempo indefinido, a saborear o tempo ocioso, o não fazer nada, o não ter nada para fazer senão estar ali, a saborear o estar ali. Seria um equivalente da já reconhecida flâneurie (para quem gosta de passear e deambular pelas ruas da cidade), mas em versão imóvel, para melhor enfantizar o seu carácter ocioso.

É uma das coisas que mais gosto de fazer, desde que entrei no mundo horroroso da gente crescida, subjugada ao trabalho. Ficar sentada numa esplanada a manhã inteira nos primeiros diras de primavera com sol. A ler ou a saborear um pequeno-almoço substancial, onde a presença de um croissant não pode faltar. A boa companhia, não sendo absolutamente imprescindível, é contudo factor condicionante do grau de satisfação proprocionado pela fruição do momento. Há quem diga que a leitura é um acto solitário, há quem diga que os silêncios são incómodos. Pois eu acho que há poucas coisas tão sedutoramente cúmplices como ler em conjunto com alguém de quem se gosta, sabendo que ainda que cada um vagueie imerso nos seus próprios pensamentos, uma mesma corrente de afecto os une, sem os perturbar.

Automaticamente, o corpo reage e a memória afectiva entra em acção: o cérebro faz-nos avançar no tempo, remete-nos de imediato para o verão, com o sol escaldante, em que estaremos numa outra esplanada a ler ou a saborear uma bebida fresca, desta vez com a praia ao fundo. Os cheiros da cidade cinzenta subitamente assemelham-se ao cheiro do mar e do peixe grelhado que se prepara à hora do almoço, o ruído dos carros converte-se no barulho das ondas. Imediatamente, aos primeiros dias de sol, só porque nos sentamos numa esplanada a saborear o dolce fare niente, imaginamo-nos a mergulhar na água salgada e a nadar descontraídamente, saboreando um dos prazeres mias naturais e antigos. Eu tenho uma velha teoria de que é ao primeiro banho de mar do ano que lavamos a alma de todas as impurezas depressivas acumuladas ao longo do inverno, e é nesse mergulho demorado que restabelecemos a nossa ligação à terra, às nossas origens, num acto com o seu quê de místico, é certo, mas no qual o que é verdadeiramente importante é o bem-estar final, no regresso a casa. Não há nada melhor do que a antecipação do verão, quando temos a certeza de que ele há-de chegar.





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quarta-feira, 17 de março de 2010



Abril é e não é o mais cruel dos meses







não é possível (ou melhor, não me apetece) explicar a ansiedade fina, como uma ardência muito subtil, com que aguardo os primeiros dias de primavera. há toda uma série de clichés que o meu corpo aguarda expectante, e às quais responde com renovada alegria. o cheiro do jasmim, das glicínias e dos lilases, misturado com o sol que aquece as paredes e os muros, misturado com o tempo roubado ao trabalho para não fazer nada senão as pequenas coisas inúteis que dão prazer... é verdade que durmo melhor na primavera, e suspeito até que sou melhor pessoa. aguardo já um pouco impacinte pelos perfumes quase a despontar e percebo subitamente que, talvez por causa deles, dos condicionamentos da poesia e da memória afectiva, só leio Ana Teresa Pereira uma vez por ano, e é na estação que está prestes a começar. depois, mais lá para o fim, vem a cereja literal em cima do bolo: o reinado breve, mas poderoso, das cerejas. não há nada que me faça tão feliz em Maio quanto as cerejas. se bem que talvez este ano consiga prever uma excepção:







The National | Terrible Love






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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010



das dores de crescimento




Fiona Apple | Oh Well



(...)
What you did to me made me see myself somethin' awful
A voice once stentorian is now again meek and muffled
It took me such a long time to get back up the first time you did it
I spent all I had to get it back, and now it seems I've been outbidded

My peace and quiet was stolen from me
When I was looking with calm affection
You were searching out my imperfections


What wasted unconditional love
On somebody
Who doesn't believe in the stuff
(...)





......................................................






uma fúria corrosiva, tão violenta quanto contida, parecendo gritada quando é apenas murmurada, entre dentes cerrados. morder com força o sítio onde dói, para o adormecer. num dado momento, isto serviu-me. trincando a língua, se se descobre veneno, o melhor é cuspir. gostei de ser isto. gostei de ser fruta esquisita, menina aflita. agora, gosto mais de ser outras coisas.







Vetiver | More of This






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posted by saturnine | 00:28 | 2 Comentários


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quarta-feira, 22 de abril de 2009



o apelo dos livros: parte i


há pelo menos duas categorias de livros: o livro-símbolo e o livro-objecto. a primeira categoria, referente ao imaterial, necessariamente corresponde ao livro que se dispõe a ser apropriado exclusivamente pela leitura, cuja relação que se estabelece com o leitor é fundamentalmente a do afecto pela história, pelo intangível do imaginário. a segunda, referente ao material, corresponde ao livro que encanta plenamente pelo objecto que é, para além da(s) narrativa(s) que encerra; é o livro que, através dos mecanismos da familiaridade e do reconhecimento, activa no leitor os seus botões internos que fazem aceder à comoção; dito de outro modo, trata-se do livro que nos fala nas várias dimensões de uma linguagem subjectiva que não é mais do que o mapa da nossa afectividade, e que desperta um desejo de apropriação, que tanto se refere a um desejo de posse do objecto físico, como a um desejo de integração simbólica do seu conteúdo.

tudo isto para afirmar, com pompa e circunstância, por que não me é possível, na maioria das vezes, ler livros emprestados, que pertencçam a um terceiro. é verdade que admiro em certa medida aqueles que se relacionam com os seus livros com um certo desprendimento. não sou capaz.
há temas que necessariamente procedem dessa tal linguagem subjectiva da nossa afectividade, que não é mais do que dizer que há assuntos que nos fascinam e apaixonam porque provocam o reconhecimento de uma identidade (a nossa), ao falarem-nos daquilo de que estamos predispostos a gostar. como se cada indivíduo tivesse inscrito um código genético do imaginário, que o faz reagir a estímulos específicos. o referencial da minha infância traz imprimido no seu âmago a imagem dos desertos: Sahara, A Lagoa Azul, por coincidência, dois filmes em que a Brooke Shields é protagonista.

sem que o soubesse, estava a plantar a semente que viria a favorecer, no futuro, o reconhecimento de uma ideia que os desertos simbolicamente encerram: a desolação magnífica de Buzz Aldrin, trazer a vastidão por dentro. este fascínio pelo deserto não exclui a sua parte de fascínio pelo desconhecido e pelo exótico, que necessariamente define a tendência para um certo nomadismo: o gosto pela viagem. por esse motivo, caminhei desde a infância construindo um imaginário que me preparava para me apaixonar por Bruce Chatwin, do mesmo modo que me predispunha para me apaixonar agora por Michel Onfray, hedonista convicto que, com a sua Teoria da Viagem (uma poética da geografia) resgata a filosofia do nomadismo de Chatwin e constrói ele próprio, de certo modo, uma anatomia da errância.

trata-se de um pequeno ensaio brilhante, que se saboreia e devora enquanto se lê, e que, falando dessa tal poética da geografia como uma geografia sentimental que é "o grande poema do mundo", me comoveu e apaixonou ao ponto de me deixar rendida. uma escrita de tom sensorial favorece a poética que despoleta os mecanismos do imaginário. aperitivo:


"Assim, num primeiro momento, é preciso aceitar os odores de um mercado oriental, os aromas do incenso, do açafrão ou do sândalo de um templo budista, desejar as cores alaranjadas, azuis e violeta de um pôr-de-sol no cume das dunas sarianas, acolher com benevolência o calor seco, brutal e dessecante de um deserto africano, escutar com deslumbramento os gritos dos pássaros raros ou dos macacos-uivadores, o coaxar dos sapos lerdos ou os zunidos dos élitros dos insectos tropicais, descobrir a sombra das ruelas, a frescura das ruas, a obscuridade dos túneis das cidades mediterrânicas, beber a água gelada de uma fonte medieval perdida numa cidade contemporânea, deixar a boca ser invadida pelo sabor de uma papaia, pela violência verde de um limão, pelo gosto amargo contudo caramelizado de um café do Kanyan, ou mesmo pelo tabaco egípcio perfumado com maçã ou pelo ópio chinês, sentir a textura e a porosidade das pedras tombadas de um templo siciliano por onde deambularam filósofos pré-socráticos - sentir violentamente o seu corpo existir na doçura de um instante vivido de uma forma mágica e magnífica."

Michel Onfray
Teoria da Viagem (uma poética da geografia)






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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008



relapso


.


era uma vez
um esgoto com três desgostos
um para cada ventrículo
e mais um
que já não cabia no coração
um dia veio um royal flush
foram-se os desgostos
ficou o espaço livre
acabou-se o esgoto
agora é só
um coração.


fim






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sexta-feira, 8 de agosto de 2008



O ponto de vista dos demónios #30


mas que não haja enganos. sou, de nascença, um ser do outono. a vida na terra é emprestada, eu pertenço aos subterrâneos. o meu demónio dorme, mas não me deixa. sinto o seu bafo quente no meu pescoço. a sua respiração soa compassada com a minha. rejubilo pela liberdade temporária do verão, pelo sabor do sal e das algas na boca ao primeiro mergulho no mar, mas continuo a carregar por dentro o fruto saturnino e as pequenas mortes. é certo que há uma intacta ferida, que sangra suspensa. é certo que me encosto sempre ao lado errado da noite. é certo que regressarei às sombras, ao submundo. mas não hoje.





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sábado, 2 de agosto de 2008



The sea, the sea








o título acima é do livro que estou a ler, de Iris Murdoch. acompanhou-me na viagem rumo ao sul, mas só no regresso se me ofereceu o momento de lhe pegar. ante a enfermidade, há que antes preparar o corpo para a cura (coisa que aprendi com Ossanha Traidor).
de partida para o sul, eu fugi para o mar. fugi como a quem urge embrenhar-se sozinho no mato e encontrar-se com deus. a mim urgia mergulhar, nadar, limpar, curar, regenerar. eu sou um ser do verão. a minha única e verdadeira vocação é deambular pelos lugares onde se pode viver do sol. parti, sequiosa, seguindo o rasto da minha sede - e a minha sede põe-me o travo do sal na boca, leva-me para o sul, onde o azul é estupidamente desconcertante e onde o vento frio da noite traz o azul-negro do céu crivado de estrelas. andei por terras onde os mouros passaram. lugares pouco mais que desolados, pequenos, onde a civilização chega só em doses muito moderadas, onde é possível esquecer que há tempo e coisas mundanas - ali, é só a presença da terra. a terra dura e árida, escarpada, impressionantes falésias ao fundo das quais se estendem silenciosos oásis de brisa fresca. a terra chama, e eu vou. ajoelho e estendo o corpo no solo quente. vergo ante o jugo implacável de um sol castigador, arde-me a pele no excesso de luz, e depois chega a redenção: um reino subitamente descoberto, a recompensa pelo esforço da sobrevivência ao caminho árduo, como uma gloriosa coroação quando a manhã vai alta, ao fundo, o mar.
o alívio que é seguir pela estrada que arde, descer 285 degraus escavados na rocha, chegar à praia quase deserta. o mar, do lado ocidental da costa (na verdade é o oceano) tem o tom atlântico característico, vagamente assustador, encapelado, ruge e rebenta violentamente antes de chegar ao areal, e a brisa salpica o corpo de água muito salgada carregada de iodo, em que não é possível nadar. do lado sul, é mar mediterrâneo, baías calmas e verdes que enchem as praias de algas e conchas, onde se nada como se não houvesse amanhã, como se se pudesse nadar até ao fim do mundo - e de lá regressar ao princípio. naturalmente (e felizmente), o lado ocidental é o menos civilizado. é quase possível não ter que articular palavra um dia inteiro. as pessoas circulam ao longe, vemo-las, ouvimos, mas fazem parte de uma história distinta e distante, não nos dizem respeito. o interesse está única e exclusivamente concentrado na paisagem, na planície queimada, os montes verdejantes, as casas caiadas de branco em silêncio absoluto, de cujas varandas e terraços mouriscos emergem cachos de buganvílias numa explosão de cor. ao fundo, o mar.
tenho no mundo um lugar de eleição, que se chama Vale dos Homens. tenho no corpo um bronzeado bonito e saudável. um dia, quando for grande, hei-de ter uma casa branca junto ao mar, com cachos de buganvílias a pender dos arcos das varandas mouriscas, algures numa rua estreita, na qual incide o sol a pique ao meio-dia e onde à noite se sente o ar perfumado, num lugar a sul, só moderadamente civilizado, algo como Aljezur.















































Conhecias o verão pelo cheiro,
o silêncio antiquíssimo
do muro, o furor das cigarras,
inventavas a luz acidulada
a prumo, a sombra breve
onde o rapazito adormecera,
o brilho das espáduas.
É o que te cega, o sol da pele.


Eugénio de Andrade, Matéria Solar






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sexta-feira, 1 de agosto de 2008



sob o signo do sol:
pré-congelado #2


quando habitualmente em Junho começa a cumprir-se a promessa anual do reino glorioso do verão, acontece qualquer coisa que me transfigura: o corpo instintivamente entra em interna movimentação. como se de uma metamorfose se tratasse, de dentro para fora, vai sendo expulso o inverno, o desaparecimento contínuo, a depressão. é uma purga. temporária, mas possível, necessária. tudo começa quando a linguagem se torna estranha, um excesso. o verão começa quando já só consigo ouvir coisas que não consigo compreender.
há música que me faz sonhar com uma Terra que eu não posso saber de todo se existe mesmo. uma visão romântica dos desertos, das plantações de café, da dureza dos lugares inóspitos onde a presença humana diz pouco da civilização, onde a água é, mais que uma benção, uma religião. mas a música leva-me a essa terra que trago dentro da cabeça, dentro do corpo, à espera de desabrochar.
entre Junho e Setembro, a única música possível é essencialmente árabe e africana. o fascínio do exotismo está claramente marcado, sempre foi assim para o homem ocidental. mas há qualquer coisa de extremamente maravilhoso em escutar aquelas vozes, como cânticos vindos do princípio e do fim do mundo, não conseguir inteligir, e sentir que assim é que está bem, tudo está no seu lugar, que é a própria terra antiga que nos fala, e que é tempo de nos entregarmos ao abandono do sofrimento excessivo.





Sines



este ano, renunciei (não sem alguma angústia) aos festivais de verão habituais. fiz a minha estreia no Festival Músicas do Mundo em Sines. de lá, trago uma injecção de boas vibrações (que conseguiu felizmente superar a minha crescente fobia de multidões e freaks e espíritos de festival), e o espanto e a alegria de dois momentos: Faiz Ali Faiz (Paquistão) e Rokia Traoré (Mali). no primeiro, levitei para outra dimensão, quase hipnotizada, como uma cobra encantada; no segundo, dancei como se não houvesse amanhã, e viajei, viajei para longe, tão longe quanto a minha cabeça me conseguiu levar. as vozes, as vozes. como se o tom de pele conferisse dignidade ao espírito: quanto mais escuro melhor. durante dias a fio, andei com um refrão paquistanês que não compreendo de todo na cabeça. músicas longuíssimas, seguramente com 10, 15, 20 minutos. cheias de cambiantes, avanços e recuos, mas sempre guiadas por uma harmonia subtil que as encerrava dentro de uma unidade implícita. ou seja: regressávamos sempre ao ponto onde algo era reconhecido, mesmo se não soubéssemos que rumo tomávamos.
sobre a voz de Rokia Traoré consigo dizer pouco, a não ser que parece trazer a África toda dentro. ia deixar aqui umas amostras, mas não sou capaz. não faz jus ao que vi e ouvi. é partir em busca, se faz favor, ver para crer (querer).





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quinta-feira, 17 de julho de 2008



(está quase) planos para dominar o mundo #5


modus operandi: first, we take Manhattan. then we take Berlin. *


ou como quem diz: the only way is up (baby). **




17 de Julho: Peter Murphy - Festival Marés Vivas, Gaia
18 de Julho: The National - Manta, Guimarães
19 de Julho: Leonard Cohen - Passeio Marítimo de Algés, Lisboa



20 de Julho and soi on:






Edward Hopper, Room by the sea


sol, mar, praia, descanso, passeios
enfim,
a puta da loucura

em férias!!!










* Leonard Cohen
** The Communards

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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008



E ele perguntava: A noite, o que é?


a noite é um lugar assombrado. um pano de fundo, negro, despido, onde emergem espectros, sombras, fantasmas - vivos, acordados, despertos de um sono indolente, quotidiano, habitando de súbito a matéria fértil das horas improváveis. um desfile de vozes interiores, um coro demoníaco que traz novas dos lugares remotos dos subterrâneos, onde a carne ferve arde e dói. um encontro à hora marcada com os ritos habituais da insónia. percorro os corredores dessa noite como quem tacteia um caminho através do medo. (e o medo é um lugar onde existe o Al Berto.) há uma criatura triste, monstruosa, de olhos bem abertos no fundo do poço da escuridão. alhures, na distância, um vago som de correntes, uma pedra que rola, montanha acima, montanha abaixo.











Whose woods these are I think I know,
His house is in the village though.
He will not see me stopping here,
To watch his woods fill up with snow.

My little horse must think it queer,
To stop without a farmhouse near,
Between the woods and frozen lake,
The darkest evening of the year.

He gives his harness bells a shake,
To ask if there is some mistake.
The only other sound's the sweep,
Of easy wind and downy flake.

The woods are lovely, dark and deep,
But I have promises to keep,
And miles to go before I sleep,
And miles to go before I sleep.


Robert Frost





do your hear me, Butterfly? miles to go before you sleep.

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spot player special




"us people are just poems"
[ani difranco]


*

calamity.spot[at]gmail.com



~*. through the looking glass .*~




little black spot | portfolio
Baucis & Philemon | tea for two
os dias do minotauro | against demons
menina tangerina | citrus reticulata deliciosa
the woman who could not live with her faulty heart | work in progress
pale blue dot | sala de exposições
o rosto de deus | fairy tales








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~*. rearview mirror .*~


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~*. spying glass .*~


a balada do café triste . ágrafo . albergue dos danados . almanaque de ironias menores . a natureza do mal . animais domésticos . antologia do esquecimento . arquivo fantasma . a rute é estranha . as aranhas . as formigas . as pequenas estruturas do ócio . atelier de domesticação de demónios . atum bisnaga . auto-retrato . avatares de um desejo . baggio geodésico . bananafish . bibliotecário de Babel . bloodbeats . caixa-de-lata . casa de cacela . chafarica iconoclasta . coisa ruim . com a luz acesa . comboio de fantasmas . complicadíssima teia . corpo em excesso de velocidade . daily make-up . detective cantor . dias com árvores . dias felizes . e deus criou a mulher . e.g., i.e. . ein moment bitte . em busca da límpida medida . em escuta . estado civil . glooka . i kant, kant you? . imitation of life . isto é o que hoje é . last breath . livros são papéis pintados com tinta . loose lips sink ships . manuel falcão malzbender . mastiga e deita fora . meditação na pastelaria . menina limão . moro aqui . mundo imaginado . não tenho vida para isto . no meu vaso . no vazio da onda . o amor é um cão do inferno . o leitor sem qualidades . o assobio das árvores . paperback cell . pátio alfacinha . o polvo . o regabofe . o rosto de deus . o silêncio dos livros . os cavaleiros camponeses no ano mil no lago de paladru . os amigos de alex . Paris vs. New York . passeio alegre . pathos na polis . postcard blues . post secret . provas de contacto . respirar o mesmo ar . senhor palomar . she hangs brightly . some variations . tarte de rabanete . tempo dual . there is only 1 alice . tratado de metatísica . triciclo feliz . uma por rolo . um blog sobre kleist . vazio bonito . viajador


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~*. the bell jar .*~



os lugares comuns: against demons . all work and no play . compêndio de vocações inúteis  .  current mood . filosofia e metafísica quotidiana . fruta esquisita menina aflita . inventário crescente de palavras mais-que-perfeitas . miles to go before I sleep . música no coração  .  música para o dia de hoje . o ponto de vista dos demónios . planos para dominar o mundo . this magic moment  .  you came on like a punch in the heart . you must believe in spring


egosfera: a infância . a minha vida dava um post . afirmações identitárias . a troubled cure for a troubled mind . april was the cruellest month . aquele canto escuro que tudo sabe . as coisas que me passam pela cabeça . fruto saturnino (conhecimento do inferno) . gotham style . mafarricar por aí . Mafia . morto amado nunca mais pára de morrer . o exílio e o reino . os diálogos imaginários . os infernos almofadados . RE: de mail . sina de mulher de bandido . the woman who could not live with her faulty heart . um lugar onde pousar a cabeça   .  correio sentimental


scriptorium: (des)considerações sobre arte . a noite . and death shall have no dominion . angularidades . bicho escala-estantes . do frio . do medo . escrever . exercícios . exercícios de anatomia . exercícios de respiração . exercícios de sobrevivência . Ítaca . lunário . mediterrânica . minimal . parágrafos mínimos . poemas . poemas mínimos . substâncias . teses, tratados e outras elocubrações quase científicas  .  um rumor no arvoredo


grandes amores: a thing of beauty is a joy forever . grandes amores . abraços . Afta . árvores . cat powa . colectânea de explicações avulsas da língua portuguesa  .  declaração de amor a um objecto . declaração de amor a uma cidade . desolação magnífica . divas e heróis . down the rabbit hole . drogas duras . drogas leves . esqueletos no armário . filmes . fotografia . geometrias . heart of darkness . ilustraçãoinício . matéria solar . mitologias . o mar . os livros . pintura . poesia . sol nascente . space is the place . the creatures inside my head . Twin Peaks . us people are just poems . verão  .  you're the night, Lilah


do quotidiano: achados imperdíveis . acidentes quotidianos e outros desastres . blogspotting . carpe diem . celebrações . declarações de emergência . diz que é uma espécie de portfolio . férias  .  greves, renúncias e outras rebeliões . isto anda tudo ligado . livro de reclamações . moleskine de viagem . níveis mínimos de suporte de vida . o existencialismo é um humanismo . só estão bem a fazer pouco


nomes: Aimee Mann . Al Berto . Albert Camus . Ana Teresa Pereira  . Bauhaus . Bismarck . Björk . Bond, James Bond . Camille Claudel . Carlos de Oliveira . Corto Maltese . Edvard Munch . Enki Bilal . Fight Club . Fiona Apple . Garfield . Giacometti . Indiana Jones . Jeff Buckley  .  Kavafis . Klimt . Kurt Halsey . Louise Bourgeois . Malcolm Lowry . Manuel de Freitas . Margaret Atwood . Marguerite Duras . Max Payne . Mia Couto . Monty Python . Nick Drake . Patrick Wolf  .  Sophia de Mello Breyner Andresen . Sylvia Plath . Tarantino . The National . Tim Burton


os outros: a natureza do mal . amigos . dedicatórias . em busca da límpida medida . retalhos e recortes



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...it's full of stars...


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