há quase um ano a New Yorker online publicou um artigo extenso sobre António Lobo Antunes que, por motivos vários (um dos quais sendo a minha inabilidade para lidar com o Google Reader então), me passou despercebido até hoje. não resisto a fazer uns quantos sublinhados, a propósito de um retrato bem apanhado, que tem laivos de caricatura, e por isso não pode deixar de me fazer sorrir:
«Internationally, Lobo Antunes is overshadowed by his older colleague José Saramago, who won the Nobel Prize in 1998. At home, the two writers, like rival political parties or sports teams, have noisy partisans, and those who cheer for Lobo Antunes claim that the wrong man won the Nobel. Lobo Antunes himself apparently agrees: when the Times called for a comment on Saramago’s victory he grumbled that the phone was out of order and abruptly hung up.
Their cramped country may not be big enough for both men, but from a distance the internecine feud hardly matters. Good novelists are unique, which makes them incomparable. Saramago is a benign magus whose fictions smilingly suspend reality; Lobo Antunes is more like an exorcist, frantically battling to cast out evil and to heal the body politic. Saramago’s secular parables, set mostly in unnamed or imaginary countries, easily float off into universality. Lobo Antunes remains obsessively local, worrying over the inherited ailments of Portuguese history and the debilities of its culture.
A novel always reveals to us the world inside someone else’s head. In the case of Lobo Antunes, that world is the size of a country — small and marginal, perhaps, but teeming with villainy and vice, and as crammed with wounds and festering sores as an overcrowded hospital ward.?> ler o artigo completo aquitenho pena de nunca ter conseguido terminar o único romance de Lobo Antunes em que peguei, ainda na adolescência. o problema foi exactamente esse, suspeito. voltei a tentar ao longo dos anos seguintes, mas o resultado foi sempre o mesmo:
A Ordem Natural das Coisas nunca passou do meio até ser arrumado de vez. nesse, sei-o de certeza absoluta, nunca mais voltarei a pegar. e também sei que o esforço minou o desejo e que, por isso mesmo, dificilmente irei ainda a tempo, entrada a idade balzaquiana, de me apetecer experimentar o Lobo Antunes só para saber como é, para além do aborrecimento que foi em tempos. por isso é que tenho pena. porque tenho na estante à espera um
Que Farei Quando Tudo Arde, que eu queria mesmo muito ter lido porque este título ilustra um período da minha vida e porque gosto mesmo muito do Sá de Miranda e porque aquele verso é dos melhores que há, do mesmo calibre de um
do not go gentle into that good night, que por acaso o Lobo Antunes também soube aproveitar para um título. o que receio e, admito, me mantém na segurança da ignorância, ou seja, sem disposição para
perder tempo, advém disso mesmo: naquilo que ele é muito bom é na escolha dos títulos; se eu pudesse ler por osmose, só por segurar um livro nas mãos, leria certamente quase todos os do Lobo Antunes, só porque os títulos são muito bons. o que acontece é que são quase sempre roubados de outros autores. então, suspeitando que o melhor de Lobo Antunes são os poemas que ele leu, acho que para já prefiro cingir-me ao Sá de Miranda e ao Dylan Thomas.
nota à margem: na mesma altura em que tentei ler
A Ordem Natural das Coisas li, de uma ponta à outra, com entusiasmo e paixão, o
Memorial do Convento do Saramago cujos contornos, passados tantos anos, começam a esbater-se na minha memória, a pedir releitura, mas não sem se manter intuitivamente no círculo mais ou menos alargado dos meus livros predilectos.
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