O que dói
É não poder apagar a tua ausência
e repetir dia após dia os mesmos gestos
O que dói
É o teu nome que ficou como mendigo
Descoberto em cada esquina dos meus versos
O que dói
É tudo mais aquilo que desteço
Ao tecer para ti novos regressos
Ítaca | Daniel Fariao poema roubei-o
daqui. era necessário. o ano anterior passei-o no deslumbramento de Ítaca, precariamente debruçada sobre
A Odisseia, e ainda agora não transporto comigo maior vertigem do que o devaneio sobre esta ilha.
a Deda conseguiu no seu post encontrar as palavras para o que eu só ousei esgravatar e encarcerar no peito: se penso em Ítaca não penso imediatamente na glória dos regressos, muito menos nas promessas cumpridas, mas sempre naquilo que dói, na 'traição' de Ulisses ao tardar-se na viagem ao encontro de Penélope, na agudez do abandono daquela que sozinha espera...
«Gostei deste poema por vários motivos. Primeiro porque se trata de uma Ítaca feminina. Explico melhor: a terra mítica e pedregosa, nestes versos, não é aquela que Ulisses almeja saudosamente rever, mas sim o espaço onde Penélope resiste sem notícias. O ponto de vista não é daquele que parte, mas sim de quem fica. Então a poesia não está no tom épico de aventuras de mares desbravados, pelo contrário, está na dor da permanência, no compasso de espera, na repetição dos gestos, na angústia da espera. "O que dói".
Há quem diga que Ulisses fez um belíssimo negócio. Viajou loucamente, fez amor com várias mulheres e, vinte anos depois, passou por ser o bonzinho que regressava para o lado da sua amada. Não foi cobrado pelas suas traições. Enquanto isso, a Penélope ficou que nem uma idiota a recusar pretendentes e a destecer uma manta inacabável. Há quem diga. (...)»o resto do post é extremamente rico em ideias que vale a pena considerar. pela minha parte, só posso agradecer por este cais me ter trazido notícias da ilha distante com que sonho, ansiando compreender.
o que dóié aguardar-te por entre as sombras
tu que te demoras
enquanto a eternidade
se me acaba nas mãos
diz-me agora desses desertos azuis
por onde te perdeste noutros braços
eu que só conheço esta noite longa
em que na espera me desfaço.
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