Até ter completanto 30 anos, não passava por mim a mais ténue ideia do que seria envelhecer. Olhando para trás, desconcerta-me a sucessão de grandes equívocos com que, de modo um pouco desastrado, sobrevivi às dores de crescimento. Mas o crescimento interrompe-se. Subitamente, já não não há tensas cordas elásticas que nos puxam - enquanto fugimos - na direcção da infância. De repente, nada nos puxa para lugar algum. Caminhamos, se caminharmos, numa direcção qualquer. O que nos espera é inteiramente novo. Mas não estamos preparados para os dias contados. O verdadeiro fascínio da infância é a imortalidade: havemos de crescer para sempre, aspiramos a ser qualquer coisa que demoraremos uma vida inteira a alcançar. E que fazer se, de súbito, nos tornamos naquilo que não previmos?

O meu primeiro equívoco surgiu em tenra idade, quando tive a certeza de que envelheceria muito cedo e definitivamente. O meu problema foi ter confundido a velhice com a amargura. Substimei a minha própria capacidade de apaziaguar as secreções dos maus fígados e corações partidos*, e agora olhem para mim, já em plena idade balzaquiana e ainda me tomam por adolescente.

(Havia, depois disto, uma reflexão que nunca chegou a ser feita. Os livros que ainda tenho para ler. A noção do tempo insuficiente. O que é irónico é ver, à distância de 10 anos passados, quando decido publicar este rascunho na data original da sua génese, o quão pouco mudou.)