A visita periódica dos velhos demónios é ritual que me lembra sempre *
Simon & Garfunkel. Com o tempo, a familiaridade converte-se numa espécie de simpatia. O terror cede lugar ao mero amedrontamento. A dor excruciante converte-se em amena perturbação. Há uma espécie de ternura no hábito do conhecimento do inferno.
Depois, há a certeza de que
isto continua sempre tudo ligado, e que a vida quotidiana justifica o seu lirismo nesta complexa teia de associações simbólicas.
Foi um mero acaso de circunstâncias que me levou primeiro ao filme
The Hours, e à
Mrs. Dalloway de Virginia Woolf depois. Lembro-me da primeira e única noite em que o filme incendiou o meu quarto, e eu me queimei quase de verdade nessa inflamação desenfreada. Foi por pouco, que sobrevivi.
Quanto à
Mrs. Dalloway, ainda hoje está em vantagem no marcador: sucumbi, não o terminei. É absolutamente irrespirável, o ar no seu interior. Um dia. Este foi o ano da domesticação do demónio
Sylvia Plath. E com isto da familiarização com o submundo não se pode querer ser muito ganancioso, de uma vez só.
Por ora, tilintam os meus cristais interiores, alargando a rede de associações líricas. Dizem-me que me perturba esta Nicole Kidman/Virginia Woolf porque me lembra a Ofélia dos pré-rafaelitas:
J.E. Millais
J.W. WaterhouseE, por sua vez, que me perturba este abandono porque me lembra o
Will Oldham, na voz de quem diz a outra louca da casa, a
Emily Dickinson:
After great pain a formal feeling comes--
The nerves sit ceremonious like tombs;
The stiff Heart questions--was it He that bore?
And yesterday--or centuries before?
The feet, mechanical, go round
A wooden way
Of ground, or air, or ought,
Regardless grown,
A quartz contentment, like a stone.
This is the hour of lead
Remembered if outlived,
As freezing persons recollect the snow--
First chill, then stupor, then the letting go.Etiquetas: april was the cruellest month, cinema, grandes amores, isto anda tudo ligado, o ponto de vista dos demónios