O ritmo é uma coisa assombrosa. Uma espécie de música silenciosa, um breve sopro inaudível, uma lenta respiração que recorda o próprio início dos tempos. Uma ténue vibração de cordas interiores, e todo o corpo repica como um sino acossado. O coração acorda, e a memória também. É quase apenas um pressentimento, o odor da chuva, a antecipação dos dias cinzentos, das horas menores. Setembro é um mês de rituais: fecham-se as mãos em concha, fecham-se as pálpebras sobre o mundo, desce a noite sobre o arvoredo. À chegada do outono, o corpo prepara-se para as cinzas. E tal como regressa a outra às profundezas da terra, pelo crime de ter provado do fruto saturnino e, com ele, do conhecimento do inferno, também eu regresso.
«Nenhuma palavra alcança o mundo. Ainda assim, escrevo». *
* Mia Couto
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